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Caiu na prova

Na doação, o bem pode voltar ao doador? entenda a cláusula de reversão

Henrique Araujo
Escrito por Henrique Araujo em maio 16, 2025
Na doação, o bem pode voltar ao doador? entenda a cláusula de reversão
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A doação é um contrato comum no cotidiano, seja entre familiares, amigos ou até em ações filantrópicas. Embora pareça simples, a doação pode envolver regras específicas previstas no Código Civil. Uma dessas regras é a chamada cláusula de reversão, que permite que o bem doado retorne ao doador em certas situações. Para entender melhor esse tema, é importante conhecer os principais pontos relacionados à doação e às cláusulas que podem ser incluídas nesse tipo de contrato.

1. O que é doação?

A doação é um contrato previsto no artigo 538 do Código Civil.

Por ele, uma pessoa transfere um bem ou vantagem para outra, sem receber nada em troca.

É um ato voluntário e gratuito.

A pessoa que doa é chamada de doador. Quem recebe é o donatário.

A doação pode ser feita por escritura pública ou por instrumento particular, dependendo do valor e da natureza do bem.

Esse contrato pode ser simples ou conter cláusulas que limitam, condicionam ou até permitem a devolução do bem.

2. Cláusulas que podem ser incluídas na doação

A doação, apesar de ser gratuita, pode conter cláusulas que impõem limites ou condições ao uso do bem doado.

Essas cláusulas são permitidas por lei e têm o objetivo de proteger interesses do doador ou de terceiros.

As principais cláusulas modificativas previstas no Código Civil são:

  • cláusula de inalienabilidade: impede que o donatário venda ou transfira o bem. Exemplo: Jessica Pearson, de Suits, doa um apartamento para Rachel Zane com cláusula de inalienabilidade. Rachel, mesmo sendo advogada e financeiramente independente, não poderá vender ou transferir o imóvel a ninguém.
  • cláusula de impenhorabilidade: protege o bem contra dívidas do donatário. Exemplo: Annalise Keating, de How to Get Away with Murder, doa um carro para Michaela Pratt com cláusula de impenhorabilidade. Se Michaela acumular dívidas e sofrer cobrança judicial, o carro não poderá ser penhorado pelos credores.
  • cláusula de incomunicabilidade: impede que o bem se comunique com o patrimônio do cônjuge. Exemplo: Harvey Specter doa uma casa para Mike Ross com cláusula de incomunicabilidade. Mesmo que Mike se case com Rachel em regime de comunhão parcial de bens, a casa continuará sendo exclusivamente dele. Rachel não terá nenhum direito sobre o imóvel.
  • cláusula de reversão: permite que o bem volte ao doador se o donatário morrer antes dele. Exemplo: Patty Hewes, da série Damages, doa uma obra de arte para Ellen Parsons com cláusula de reversão. Se Ellen falecer antes de Patty, a obra não será herdada por ninguém da família de Ellen. Ela retornará automaticamente ao patrimônio de Patty.

Cada uma dessas cláusulas tem efeitos específicos e deve ser expressamente prevista no contrato de doação.

3. O que é a cláusula de reversão?

A cláusula de reversão está prevista no artigo 547 do Código Civil.

Diz o artigo: “O doador pode estipular que os bens doados voltem ao seu patrimônio, se sobreviver ao donatário“.

O Parágrafo único diz o seguinte: “Não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro.”

Ela permite que o bem doado retorne ao patrimônio do doador se o donatário morrer antes dele.

Essa possibilidade deve estar expressa no contrato de doação. Sem essa previsão, o bem não retorna automaticamente.

A reversão tem como finalidade proteger o doador. Se ele sobrevive ao donatário, não faz sentido o bem seguir para os herdeiros deste.

Com a reversão, o bem volta para quem o doou, como se a doação não tivesse ocorrido.

Esse retorno é automático. Não depende de ação judicial, nem de autorização dos herdeiros.

4. Natureza jurídica da cláusula de reversão

A cláusula de reversão funciona como uma condição resolutiva.

Isso significa que a doação continua válida enquanto o donatário estiver vivo.

Mas, se ele morrer antes do doador, a doação se desfaz.

Nesse caso, o bem retorna automaticamente ao patrimônio do doador, sem necessidade de nova escritura ou autorização judicial.

Esse efeito está previsto no artigo 547 do Código Civil.

A cláusula de reversão não depende da vontade dos herdeiros nem do donatário. É uma consequência legal e automática, desde que a cláusula tenha sido prevista expressamente no contrato.

5. E se os dois morrerem ao mesmo tempo?

Imagine que o doador e o donatário morrem juntos, como em um acidente de avião. O que acontece com o bem doado? Ele volta para o doador?

A resposta é: não necessariamente.

Essa situação é chamada de comoriência, e está prevista no artigo 8º do Código Civil. Quando não é possível saber quem morreu primeiro, a lei presume que ambos faleceram ao mesmo tempo.

E por que isso importa?

Porque a cláusula de reversão só funciona se o donatário morre antes do doador. É a chamada condição resolutiva. Sem essa ordem clara dos fatos, a cláusula não tem efeito.

Assim, em caso de comoriência, o bem não retorna ao doador. Ele segue o caminho normal da herança, indo para os herdeiros do donatário.

6. A cláusula de reversão pode ser usada por outros motivos?

E se o donatário descumprir uma condição do contrato? Ou usar o bem de forma inadequada? Será que o doador pode exigir a devolução com base na cláusula de reversão?

A resposta é não.

A cláusula de reversão não é uma punição. Ela serve apenas para uma situação bem específica: a morte do donatário antes do doador.

Ela não se aplica em caso de descumprimento de encargos, desvio de finalidade ou qualquer outro motivo.

Nesses casos, o doador até pode ter direito de reaver o bem, mas precisará usar outros instrumentos jurídicos, como a revogação da doação por ingratidão ou por inadimplemento do encargo.

Ou seja, a cláusula de reversão tem um limite bem claro: só vale para a hipótese de premoriência do donatário. Nada além disso.

7. A reversão pode beneficiar outra pessoa além do doador?

Não. A cláusula de reversão só pode beneficiar o próprio doador.

O Código Civil, no artigo 547, permite que o doador preveja o retorno do bem doado para si, caso ele sobreviva ao donatário.

O parágrafo único do mesmo artigo é claro: não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro.

Ou seja, não é possível indicar um filho, um amigo ou qualquer outra pessoa como beneficiário da reversão. Se isso for feito, a cláusula será considerada sem efeito.

Portanto, se o doador quiser garantir o retorno do bem, deve prever expressamente que o bem volta ao seu próprio patrimônio e observar os requisitos legais para validade da cláusula.

Em resumo…

resumo doação

A cláusula de reversão é uma ferramenta útil, mas exige atenção. Não basta ter boa intenção ao doar. É preciso planejar e deixar claro o que deve acontecer se a ordem natural da vida se inverter.

Como vimos, essa cláusula só produz efeitos em um caso específico: quando o donatário morre antes do doador. E mesmo assim, ela precisa estar expressamente prevista no contrato.

Compreender essas regras evita surpresas futuras. Também ajuda a elaborar contratos mais seguros e ajustados à realidade das partes envolvidas.

Conhecer os limites da cláusula de reversão não é apenas útil em provas ou concursos. É essencial para a prática jurídica e para quem atua com planejamento patrimonial.

Como a cláusula de reversão pode aparecer em provas?

Após entender os aspectos fundamentais da cláusula de reversão na doação, é importante visualizar como esse conteúdo é cobrado em concursos. Questões objetivas costumam explorar tanto a literalidade do artigo 547 do Código Civil quanto suas interpretações práticas.

A seguir, analisamos uma questão real do concurso de juiz substituto do Tribunal de Justiça de São Paulo, edição 191 (2024). A pergunta exige não apenas a leitura atenta da lei, mas também a compreensão de seus limites e efeitos, como no caso da comoriência e da possibilidade de reversão em favor de terceiros.

Vamos à questão:

Questão TJSP – Juiz Substituto (191º, 2024)

Na doação com cláusula de reversão, é correto afirmar:

(A) havendo comoriência entre o doador e o donatário, a cláusula de reversão não surtirá efeitos, transferindo-se o bem doado aos sucessores do doador.
(B) a cláusula de reversão impõe limitação exclusivamente ao donatário, em virtude de premoriência ao doador, condicionando o contrato de doação a uma condição resolutiva.
(C) a reversão do bem ao patrimônio do doador subordina-se exclusivamente ao evento morte, vedada a estipulação da cláusula para as hipóteses de descumprimento de condição ou encargo ou ainda ao perfazimento de termo.
(D) admite-se a cláusula de reversão em favor do doador ou de terceiro.

A doação é um contrato comum, mas que pode envolver cláusulas que modificam seus efeitos. Uma delas é a cláusula de reversão, prevista no artigo 547 do Código Civil. Trata-se de uma previsão contratual que determina o retorno do bem doado ao patrimônio do doador caso este sobreviva ao donatário.

Essa cláusula é classificada como uma condição resolutiva expressa, que desfaz a doação no momento em que o donatário falece antes do doador. Trata-se de uma cláusula personalíssima, válida apenas em benefício do doador, sendo vedada sua estipulação a favor de terceiros, conforme o parágrafo único do artigo 547.

Comentário das alternativas

Alternativa A – Incorreta
É verdade que, em caso de comoriência (isto é, morte simultânea sem possível definição de quem morreu primeiro), a cláusula de reversão não produz efeitos. Isso porque a cláusula exige que o doador sobreviva ao donatário. No entanto, o erro está em afirmar que, nesse caso, o bem será transferido aos sucessores do doador. O correto é que o bem permanece com o donatário, integrando seu patrimônio, e será transmitido aos herdeiros do donatário, não aos do doador.

Alternativa B – Correta
Essa é a alternativa que expressa com exatidão o que diz a lei. A cláusula de reversão é uma condição resolutiva que se verifica se o donatário morrer antes do doador. Nesse caso, o bem retorna ao patrimônio do doador.
A expressão “premoriência ao doador” significa justamente que o donatário faleceu primeiro, o que permite a eficácia da cláusula.
A limitação recai exclusivamente sobre o donatário, pois ele não pode transmitir o bem aos seus sucessores se falecer antes do doador.
Trata-se de cláusula intuitu personae, vedando-se, inclusive, sua transmissão a herdeiros.

Alternativa C – Incorreta
A alternativa parte de uma ideia correta: a cláusula de reversão só se aplica em caso de morte do donatário antes do doador e não pode ser utilizada como penalidade por descumprimento de encargos ou prazos.
No entanto, a redação é incompleta e ambígua, pois não aborda o ponto central da cláusula: sua natureza personalíssima e a necessária sobrevivência do doador como condição de eficácia.
Além disso, ignora o conteúdo do parágrafo único, que proíbe reversão em favor de terceiros.

Alternativa D – Incorreta
Essa alternativa está frontalmente contrária ao parágrafo único do artigo 547 do Código Civil, que dispõe expressamente que “não prevalece cláusula de reversão em favor de terceiro”.
Portanto, embora o caput do artigo mencione que o bem pode ser devolvido ao doador, não se admite a estipulação em favor de outra pessoa, sob pena de se configurar pacto sucessório (vedado pelo art. 426 do CC).
A cláusula de reversão só pode ser válida se o bem retornar ao doador, e não a terceiros.

Gabarito: letra B

Essa questão exige do candidato mais do que uma leitura literal do Código. Ela requer compreensão da lógica da cláusula de reversão, de seus limites legais, e da natureza personalíssima do contrato de doação com reversão.

Dominar esse conteúdo ajuda não só em provas como esta, mas também na prática de planejamento patrimonial e no exame da validade de cláusulas contratuais.

Recomendação de leitura: Manual de Direito Civil, volume único, do Professor Flávio Tartuce.

Até a próxima! Bons estudos.

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