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Constitucional

STF NÃO INOVOU no ordenamento em decisão sobre perda de nacionalidade

Henrique Araujo
Escrito por Henrique Araujo em abril 25, 2016
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Salve, salve queridos amigos brasileiros natos, naturalizados e estrangeiros que estão lendo isso aqui em plena noite de domingo de início de temporada de GOT! Difícil concorrer com uma das séries mais assistidas do mundo, mas vamos tentando…

Hoje iremos conversar a respeito de uma decisão do STF que causou um certo burburinho nas redes sociais.


Não sei se você está por dentro, mas essa semana uma decisão do Supremo Tribunal Federal foi pauta de dezenas de manchetes jornalísticas, retratada como se algo fora do normal tivesse sido feito, como uma espécie de inovação no ordenamento jurídico.

Resumo do caso 

Trata-se do julgamento do Mandado de Segurança 33.864. Não vou copiar todo o caso aqui até porque se você quiser ler tudo basta acessar os autos virtuais desse processo ou ler alguma notícia citando ele (clique aqui). Mas vou fazer um resuminho prático:

Uma brasileira NATA que morava nos EUA e cometeu um crime na terra do tio Sam. Pois bem, aproveitando-se do fato de possuir passaporte brasileiro, a moça fugiu para terras tupiniquins para não ser sancionada pela lei norte-americana.

No meio dessa treta, o ministério da justiça, por meio de portaria, declarou a perda da nacionalidade da até então brasileira, uma vez que ela tinha adquirido voluntariamente a nacionalidade norte-americana, mesmo possuindo “passe livre” nas terras de lá, o famoso e por muitos almejado green card. Assim, ela não precisava se naturalizar lá e mesmo assim o fez.

O crime cometido da impetrante foi um homicídio praticado contra seu marido em março de 2007. Logo, sabemos como são as penas nos EUA de crimes do tipo, por isso ela pediu liminar e foi deferido. 

Além disso, por possuir quase 8 anos de espera, era necessário definir o caso porque o crime de homicídio prescreve no Brasil em 20 anos e o processo já estava indo pra metade desse prazo, por mais que em outras jurisdições seja imprescritível, aqui não é assim. Então já tava mais do que na hora desse caso ser julgado.

Por conta disso, ela entrou com mandado de segurança c/c pedido liminar pedindo a suspensão dos efeitos dessa portaria no STJ, que fora deferida de pronto, impedindo assim sua extradição requerida pelo pessoal dos EUA.

O PGR Rodrigo Janot pediu declinação de competência para o STF pois trata-se de matéria acerca de extradição e foi assim que a confusão foi parar no Supremo. Na verdade não era nem pra ter ido parar no STJ, mas eles reconheceram o vício de incompetência a tempo.

Questões jurídicas

Primeiro vamos analisar a competência. De fato o STF é o competente para julgar a presente demanda, pois trata-se de mandado de segurança impetrado contra ministro de justiça envolvendo matéria “extradicional”. Da mesma forma seria competente o STF se a ação em tela fosse um habeas corpus (HC n.º 83.113/DF e no HC 119.920/DF, ambos julgados pelo STF).

Dessa forma, o STJ não era competente para julgar o caso e reconheceu isso bem depois. Porém, apesar de ter declinado competência, manteve a liminar concedida. Por se tratar de competência originária, absoluta, todos os atos decisórios prolatados pelo STJ devem ser extintos (são nulos de pleno direito) do ordenamento jurídico, ou seja, a liminar que nem era pra ser concedida estava com os dias contados.

Segundo: Vamos analisar qual foi o principal fundamento da defesa. O fundamento constitucional utilizado foi o Art. 5º, LI de nossa Constituição Federal, segundo o qual nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei. 

De fato é um absurdo cogitar a possibilidade de um brasileiro nato ser extraditado e é isso que a Constituição veda. Porém, por mais que não haja a possibilidade de um brasileiro ostentando a qualidade de nato ser extraditado, um brasileiro nato pode deixar se assim ser considerado. E, sendo assim, pode chegar a ser extraditado e foi nesse sentido que o STF se posicionou.

Ou seja: Um brasileiro NATO pode perder sua nacionalidade. E isso não é novidade alguma, inclusive é previsão expressa de nossa constituição. Sendo assim, a partir do momento em que o brasileiro deixa de ser considerado nato, a capa de proteção contra a extradição deixa de existir e foi isso que aconteceu com a moça que fugiu dos EUA buscando refúgio em terras brasileiras.

Previsão constitucional da perda da nacionalidade de brasileiro nato

A possibilidade de brasileiro nato ou naturalizado perder a nacionalidade está prevista no art. 12, §4º,I que é no caso de adquirir outra nacionalidade. 

Mas Henrique então se eu conseguir uma segunda nacionalidade necessariamente perderei a nacionalidade brasileira?

Não! Existem duas exceções. Se o então brasileiro estiver dentro dessas duas exceções, ele manterá sua condição de brasileiro, seja nato ou naturalizado. São elas

I – O País estrangeiro reconhecer sua nacionalidade originária brasileira. Ou seja: Se o País que você quer adquirir nacionalidade reconhecer sua nacionalidade brasileira, você pode ficar com a dupla nacionalidade.

II – Haver imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis. Exemplo: O País que você está obriga você a adquirir a nacionalidade deles para que você possa permanecer em solo estrangeiro. Nesse caso você não está adquirindo voluntariamente, por isso não será penalizado com a perda de sua nacionalidade brasileira. Isso acontece muito com jogadores de futebol.

O que ficou resolvido no caso em questão?


Por 3×2 ficou decidido no MS a perda da nacionalidade da impetrante bem como a cassação da liminar irregularmente concedida pelo STJ em 2013 que estava postergando o fim dessa história. 

Desta forma, não há mais óbice quanto à extradição dela para responder nos EUA pelo crime de homicídio, pois ela não possui mais vínculo com o Estado brasileiro. Observe que a extradição não tem mais problema porque ela veio depois da decretação da perda de nacionalidade. 

Na verdade o pedido de extradição requerido pelo governo dos EUA estava lá congelado esperando a decisão brasileira sobre a nacionalidade da agente, enquanto não ficou decretada a perda de sua nacionalidade brasileira de nada valia o pedido de extradição, mas agora que ela perdeu… o caso vai para a justiça dos EUA.

Então observe o seguinte: Brasileiro nato não pode ser extraditado, mas quando ele perder a nacionalidade (quando não está naquelas duas exceções) ele deixa de ser considerado nato e, sendo assim, o ex-brasileiro nato pode sim sofrer a sanção de extradição e responder pelo crime no País em que o crime foi cometido.

Bônus: Você sabia que esse assunto já foi cobrado na prova da OAB recentemente?


Ano passado o tema nacionalidade foi abordado na primeira fase do exame da OAB. Inclusive eu postei aqui a questão do XVII e comentei todos os itens e ainda fiz um resuminho do assunto antes de responder a questão. Se você tiver interesse em dar uma conferida clique aqui. Bons estudos, até a próxima!

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2 Replies to “STF NÃO INOVOU no ordenamento em decisão sobre perda de nacionalidade”

keywison lucas

Ótimo artigo Henrique, parabéns cara!

Henrique Araújo

Obrigado pelo comentário Lucas, fico feliz em vê-lo por aqui. Abraço.